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Capítulo 4 - Separação: "parece que vão arrancar minha vida"

19 nov 2014 - 11h06
(atualizado em 19/10/2015 às 22h17)
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Depois de meses e ansiedade, chegou o dia de deixar a filha de 1 ano partir dos braços de outra pessoa. Maria tentava buscar a normalidade para a festinha. Decoração, amiguinhos, fotos, tudo como manda o figurino. Mas a cabeça da mãe estava em outro lugar, só a criança parecia ignorar o que estava prestes a acontecer.

A festa, apesar de ocorrida em um presídio, foi como qualquer outro aniversário de 1 ano
A festa, apesar de ocorrida em um presídio, foi como qualquer outro aniversário de 1 ano
Foto: Mauricio Tonetto / Terra

A relação e a rotina de desabafo ao contar sua história, ou simplesmente por ter alguém com quem conversar fizeram com que Maria só começasse a festa quando estivéssemos lá. Tanto que a festa começou com atraso, já que a administração do presídio demorou para liberar a nossa entrada.

Nem a música da Xuxa parecia distrair Maria, que se mostrava mais agitada do que o normal. Ela andava de um lado para o outro trocando a filha de roupa, para que usasse cada um dos trajes que havia ganhado de presente. A todo momento perguntava para as pessoas se não queriam comer alguma coisa.

O bolo seguiu o padrão decorativo da festa
O bolo seguiu o padrão decorativo da festa
Foto: Mauricio Tonetto / Terra

No dia da separação, Maria parecia tentar ignorar o que estava prestes a acontecer. A ansiedade vivida nos últimos dias chegara ao ápice provocando até reações físicas. Vômitos,  perda de peso e o uso de ansiolíticos fizeram parte deste período no qual ela e a filha viveram a maternidade de forma muito intensa, talvez até mais do que muitas mães nas ruas porque só tinham uma a outra, já que estavam isoladas da família em Porto Alegre.

Maria olhava para a filha chorando copiosamente
Maria olhava para a filha chorando copiosamente
Foto: Daniel Favero / Terra

 "Parece que vão me arrancar a minha vida, a Rosa é o amor da minha vida (...) Estou muito ansiosa, muito agitada, bastante nervosa, qualquer coisa irrita, qualquer coisa  incomoda (...) olho para ela o tempo inteiro, quando ela dorme, quando ela respira".

Terezinha e o marido estavam lá, mas preferiram ficar em um canto deixando Maria aproveitar os últimos momentos com a filha. Levantavam apenas para as fotos. Mas depois de algumas horas já demonstravam um pouco de ansiedade para sair de lá. "A gente nunca pensa que alguma vez vai entrar em um presídio", diz o companheiro.

Foto: Mauricio Tonetto / Terra

Adeus

O momento da separação começa a se aproximar. Maria entrega a Terezinha uma carta de várias páginas com todas as instruções para cuidar da filha. Ela amamenta a criança para fazê-la dormir e a entrega para a amiga. O choro compulsivo de Maria provoca a mesma reação nas outras presas. Acaba o clima de alegria. Todas saem para os cantos para chorar. A entrega definitiva da criança leva quase uma hora. 

Foto: Mauricio Tonetto / Terra

Maria dá o último adeus pelas grades do presídio, e logo em seguida é abraçada pelas outras presas, como se tentassem preencher o vazio deixado pela filha. "Tu deu o teu último passo aqui", confortava uma das detentas.

Maria observa a filha passar pelo portão do presídio Madre Pelletier pela última vez
Maria observa a filha passar pelo portão do presídio Madre Pelletier pela última vez
Foto: Mauricio Tonetto / Terra

Nesse momento, se fechou o capítulo mais difícil da vida de Maria com a filha na prisão.

Observando a cena da criança passando pelo portão que separa a parte administrativa do local onde as presas ficam alojadas, Maria parecia observar um pedaço de sua vida partir nos braços de outra família, uma imagem de cortar o coração de qualquer pessoa.

A partir daquele momento, ela começaria uma vida nova e visitaria a mãe a cada 15 dias nas visitas ao Presídio Industrial de Caxias do Sul, para onde foi transferida.

Para a mãe, apesar da condenação de 10 anos e da violência física e psicológica pela qual passou na prisão, a fase mais difícil ainda estava por começar, viver sem quem lhe deu sentido para vida em um dos momentos mais complicados de sua existência.

Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Capítulo 4 - Separação: "parece que vão arrancar minha vida":
Fonte: Terra
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