Depois de meses e ansiedade, chegou o dia de deixar a filha de 1 ano partir dos braços de outra pessoa. Maria tentava buscar a normalidade para a festinha. Decoração, amiguinhos, fotos, tudo como manda o figurino. Mas a cabeça da mãe estava em outro lugar, só a criança parecia ignorar o que estava prestes a acontecer.
A relação e a rotina de desabafo ao contar sua história, ou simplesmente por ter alguém com quem conversar fizeram com que Maria só começasse a festa quando estivéssemos lá. Tanto que a festa começou com atraso, já que a administração do presídio demorou para liberar a nossa entrada.
Nem a música da Xuxa parecia distrair Maria, que se mostrava mais agitada do que o normal. Ela andava de um lado para o outro trocando a filha de roupa, para que usasse cada um dos trajes que havia ganhado de presente. A todo momento perguntava para as pessoas se não queriam comer alguma coisa.
No dia da separação, Maria parecia tentar ignorar o que estava prestes a acontecer. A ansiedade vivida nos últimos dias chegara ao ápice provocando até reações físicas. Vômitos, perda de peso e o uso de ansiolíticos fizeram parte deste período no qual ela e a filha viveram a maternidade de forma muito intensa, talvez até mais do que muitas mães nas ruas porque só tinham uma a outra, já que estavam isoladas da família em Porto Alegre.
"Parece que vão me arrancar a minha vida, a Rosa é o amor da minha vida (...) Estou muito ansiosa, muito agitada, bastante nervosa, qualquer coisa irrita, qualquer coisa incomoda (...) olho para ela o tempo inteiro, quando ela dorme, quando ela respira".
Terezinha e o marido estavam lá, mas preferiram ficar em um canto deixando Maria aproveitar os últimos momentos com a filha. Levantavam apenas para as fotos. Mas depois de algumas horas já demonstravam um pouco de ansiedade para sair de lá. "A gente nunca pensa que alguma vez vai entrar em um presídio", diz o companheiro.
Adeus
O momento da separação começa a se aproximar. Maria entrega a Terezinha uma carta de várias páginas com todas as instruções para cuidar da filha. Ela amamenta a criança para fazê-la dormir e a entrega para a amiga. O choro compulsivo de Maria provoca a mesma reação nas outras presas. Acaba o clima de alegria. Todas saem para os cantos para chorar. A entrega definitiva da criança leva quase uma hora.
Maria dá o último adeus pelas grades do presídio, e logo em seguida é abraçada pelas outras presas, como se tentassem preencher o vazio deixado pela filha. "Tu deu o teu último passo aqui", confortava uma das detentas.
Nesse momento, se fechou o capítulo mais difícil da vida de Maria com a filha na prisão.
Observando a cena da criança passando pelo portão que separa a parte administrativa do local onde as presas ficam alojadas, Maria parecia observar um pedaço de sua vida partir nos braços de outra família, uma imagem de cortar o coração de qualquer pessoa.
A partir daquele momento, ela começaria uma vida nova e visitaria a mãe a cada 15 dias nas visitas ao Presídio Industrial de Caxias do Sul, para onde foi transferida.
Para a mãe, apesar da condenação de 10 anos e da violência física e psicológica pela qual passou na prisão, a fase mais difícil ainda estava por começar, viver sem quem lhe deu sentido para vida em um dos momentos mais complicados de sua existência.
Rosinha almoçando em casa com a família, já em liberdade
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Terezinha ao lado de Rosinha em casa
Foto: Terra
Quarto de Rosinha com a cama coberta de brinquedos
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Após viver em liberdade, ela passa os dias brincando
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Maria, em liberdade, mas ainda atormentada com a caminhada árdua que teria que enfrentar
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Terezinha e Rosa criaram um laço muito forte de maternidade
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
O pai de Rosa só foi ter o primeiro contato com a criança depois de um ano
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
A família alugou uma casa para poder passar os domingos juntos durante o cumprimento da pena no semiaberto
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Maria fazia de tudo para tentar encontrar a normalidade depois da prisão
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Rosa e sua girafa de pelúcia na casa da nova família
Foto: Daniel Favero / Terra
Fachada da Penitenciária Industrial de Caxias do Sul
Foto: Daniel Favero / Terra
Detentas abraçam Maria após ela entregar a filha para a nova família, mesmo que temporariamente
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Rosa nos braços da nova irmã em Caxias do Sul
Foto: Daniel Favero / Terra
Berço de Rosa na casa da nova família em Caxias
Foto: Daniel Favero / Terra
Maria após voltar para o presídio de Caxias do Sul, já afastada da filha
Foto: Daniel Favero / Terra
Maria observa a filha deixar seus braços no presídio pela última vez em Porto Alegre
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Momento no qual a criança é entregue para a nova família
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Maria tenta prolongar os últimos momentos que ainda teria com a filha
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Chorando muito, ela olha a filha nos poucos minutos que lhe restam ao seu lado
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Maria tenta amamentar a filha, para que ela deixe o presídio dormindo
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Aquele dia talvez tenha sido o mais difícil da vida de Maria
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Moranguinho foi o tema da festa de aniversário e despedida
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Quem visse de fora veria apenas uma festa de aniversário, que logo depois ganhou contornos de funeral
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Coleguinhas, filhso de outras detentas, também aproveiraram a festa
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
A festa teve decoração igual a qualquer outra comemoração fora dos presídios
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Carrinhos de bebê e cadeirinhas usadas pelas detentas com filhos em Porto Alegre
Foto: <p>Carrinhos de bebê e cadeirinhas usadas pelas detentas com filhos em Porto Alegre</p>
Maria com a filha no período no qual viveu a maternidade de forma muito intensa
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Berço no presídio Madre Pelletier
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Corredores do presídio Madre Pelletier, o parquinho de Rosa
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Brinquedos espalhados pelo chão do presídio
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Rosa brinca com uma bola no presídio
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Nova família no dia da festa de aniversário
Foto: Mauricio Tonetto / Terra
Carrinhos e cadeiras de bebê usado pelas detentas que tiveram filhos enquanto encarceiradas
Foto: Daniel Favero / Terra
Rosa no berço no qual dormiu nos primeiros meses de vida dentro do presídio
Foto: Reprodução
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Capítulo 4 - Separação: "parece que vão arrancar minha vida":