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Ação do Bope no Ônibus 174 foi "desastrosa", diz ex-capitão

Avaliação é do hoje consultor em segurança Rodrigo Pimentel, que também foi coprodutor de documentário sobre sequestro que completa 15 anos

12 jun 2015 - 09h56
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Caso emblemático de “ação desastrosa” da Polícia Militar do Rio: assim o hoje consultor em segurança pública Rodrigo Pimentel, 44 anos, define a operação que terminou com uma refém e o sequestrador mortos no sequestro do ônibus 174. O caso, que marcou a crônica policial do Brasil e repercutiu fortemente na imprensa estrangeira, aconteceu há exatos 15 anos no Jardim Botânico, zona sul da capital fluminense.

À época, Pimentel era assessor do comando da PM, mas já havia sido capitão do Bope (Batalhão de Operações Especiais), grupo de elite da PM, durante sete anos. Além das análises em segurança pública, o ex-capitão também foi coprodutor do documentário “Ônibus 174” ao lado do diretor José Padilha, que, anos depois, dirigiria a ficção “Tropa de Elite”, da qual Pimentel foi um dos roteiristas.

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Hoje consultor em segurança pública, Rodrigo Pimentel atuou no Bope durante sete anos e considerou a ação da corporação no episódio do ônibus 174 "desastrosa"
Hoje consultor em segurança pública, Rodrigo Pimentel atuou no Bope durante sete anos e considerou a ação da corporação no episódio do ônibus 174 "desastrosa"
Foto: Arquivo Pessoal / Divulgação

Em entrevista ao Terra, o consultor afirma que tanto o sequestro como a forma como ele foi resolvido foram “uma tragédia". “A polícia à época não tinha treinamento adequado, nem doutrina, nem os equipamentos que eram necessários para lidar com esse tipo de situação”, diz. No momento em que soube do sequestro, Pimentel estava no gabinete do chefe do Estado Maior à época, o coronel Wilton Soares Ribeiro.

O ônibus 174 fazia a linha Gávea-Central e havia acabado de deixar o ponto final localizado nas proximidades da favela da Rocinha. Um passageiro notou quando Sandro do Nascimento entrou no coletivo com um revólver na cintura e sinalizou para a polícia, que seguiu e cercou o veículo. Em seguida, veio o Bope. Sandro tomou algumas passageiras de refém – e acabou saindo quase cinco horas depois usando a professora Geísa Firmo Gonçalves como escudo. Com sequestrador e refém do lado de fora, um policial do Bope atirou para acertar o rapaz, mas atingiu de raspão o queixo de Geísa. Ela foi derrubada pelo sequestrador, atingida pela arma dele três vezes e morreu a caminho do hospital. Sandro foi levado preso pelo Bope, mas acabou morto dentro da viatura por asfixia. Anos depois, os três PMs acusados pelo assassinato de Sandro foram absolvidos em júri popular.

“O Bope hoje é outra coisa muito diferente se analisarmos, por exemplo, que desde aquela época até hoje já se resgataram mais de 200 vidas que eram reféns de criminosos. Mas, na época, o be-a-bá não foi feito: a área do sequestro não foi sequer isolada, a contenção não foi feita, as equipes, em cenas constrangedoras transmitidas pelas TVs, à época, se comunicavam por gestos. O batalhão não dispunha de equipamentos mínimos de comunicação”, enumerou. “Além disso, os policiais que atenderam a ocorrência estavam na favela do Morro Santa Marta, em Botafogo (zona sul), apreendendo fuzis, quando foram mandados direto para sequestro no Jardim Botânico – isso não é algo profissional, pois o PM, para lidar com situação com reféns, precisa, além de treino, de estar descansado. Não pode estar estressado com nada. Isso não aconteceu com o episódio do ônibus 174”, lembra.

O sequestrador havia sido um dos sobreviventes da chacina da Candelária, no centro do Rio, em julho de 1993
O sequestrador havia sido um dos sobreviventes da chacina da Candelária, no centro do Rio, em julho de 1993
Foto: Reprodução

Conforme o consultor, não apenas a forma como Geísa foi libertada – após o tiro de raspão do PM, mais os três efetuados por Sandro, nas costas dela – foi desastrosa, como a morte do sequestrador, dentro da viatura, estrangulado. “Mas o Sandro estava disposto a matar a Geísa, é importante lembrar disso”, salienta. “O erro da PM ali não foi nem do tenente que atirou e acertou a refém, mas do Bope, e um erro estrutural. Não é razoável acusar policial por uma falha sistêmica”, avalia.

“Tivemos um salto de doutrina em todo o Brasil – houve, por exemplo, uma Copa do Mundo que obrigou as PMs a montarem times especiais de resgate e intervenção; houve o advento da Força Nacional de Segurança (em 2004), que nivelou a instrução a instrução em várias polícias... Evidente que as 27 PMs do País não estão em pé de igualdade, mas acho pouco provável em qualquer Estado uma ocorrência tão desastrosa quanto a do 174”, relata Pimentel. “Mas hoje, em uma sala de aula do Bope, há uma instrução voltada para situações envolvendo ônibus; além disso, os policiais do batalhão fazem hoje cursos de capacitação e intercâmbio na Europa, algo pouco provável se não tivesse acontecido o episódio”, observa.

Sensação de segurança piorou, diz consultor

Para o cidadão carioca, no entanto, Pimentel opina que a sensação de insegurança hoje é maior que a de 15 anos atrás – a despeito de os índices de crimes contra a vida sofrerem redução nos anos recentes.

“O Rio apresentou em março de 2015 a menor taxa de homicídios dos últimos 24 anos; pouca gente sabe disso, porque só se veem as notícias ruins. Mas houve redução de roubos a coletivo, de roubos de carros, e queda nos homicídios. Só que a sensação hoje do carioca é a de que, 15 anos depois, a falta de segurança é igual ou quem sabe pior que a de 12 de junho de 2000. Nunca tivemos tantos casos de assalto em metrô, [trens da] Supervia, gente esfaqueada... Para a população, fica a sensação de que pouca coisa mudou”.

Fonte: Terra
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