PUBLICIDADE

Ainda não se pode afirmar erro humano no AF 447, diz BEA

29 jul 2011 - 12h17
Compartilhar
Lúcia Müzell
Direto de Paris

Apesar de diversos procedimentos de voo adotados pelos pilotos do AF 447 não corresponderem ao padrão que deveria ter sido ser realizado, o Escritório de Investigações e Análises (BEA), que apura as causas do acidente com o avião da Air France entre Rio de Janeiro e Paris, diz que ainda não pode afirmar que erro humano foi a principal causa da tragédia. "Neste estágio das investigações, não podemos afirmar que houve erro humano", declarou o chefe da equipe, Alain Bouillard, ao final da coletiva de imprensa do BEA nesta tarde em Paris.

As caixas-pretas foram apresentadas à imprensa e às famílias das vítimas poucas horas após chegarem à França
As caixas-pretas foram apresentadas à imprensa e às famílias das vítimas poucas horas após chegarem à França
Foto: AFP

Veja na íntegra relatório que aponta causas da queda do AF 447

Veja as novas recomendações de segurança do BEA

O órgão divulgou nesta sexta-feira o terceiro relatório oficial sobre a tragédia, no qual relatou as circunstâncias do acidente, minuto a minuto, mas não apontou as responsabilidades pela queda. O documento aponta uma série de supostos erros dos pilotos na tentativa de retomar o controle do avião depois que as informações sobre a velocidade da aeronave se mostraram incoerentes e o alarme de estol (que acusa perda de sustentação) começou a apitar na cabine.

As incertezas sobre haver ou não erro dos pilotos se devem ao fato de que, nos gravadores dos parâmetros de voo, os investigadores não encontraram as informações relativas ao painel do segundo copiloto, que auxiliava o primeiro a comandar a aeronave no momento em que o sistema de medição da velocidade do Airbus entrou em pane. Sem os dados, não é possível saber por que os copilotos decidiram empinar a aeronave, ao invés de manter ou até diminuir a altitude, como seria recomendável.

"Não conseguimos compreender as atitudes dos pilotos. Vamos continuar trabalhando na investigação para desvendar por que eles fizeram determinadas coisas e por que não compreenderam que o avião estava caindo", disse o diretor do BEA, Jean-Paul Troadec.

A inclusão de um maior número de dados do voo nas informações gravadas nas caixas-pretas é uma das recomendações de segurança que o BEA realizou hoje, em paralelo ao relatório sobre o acidente. Os investigadores ainda esperam conseguir obter as informações dispostas no visor do segundo piloto do AF 447 até o final dos trabalhos, combinando outros dados de que dispõem.

Para desvendar o que levou os dois pilotos a fazerem exatamente o oposto do que deveriam ter feito, o BEA acrescentou um Grupo de Trabalho Fator Humano às investigações, do qual farão parte psicólogos, médicos, especialistas em aviação e ergonomia. A partir das conversas da tripulação, gravadas nas caixas-pretas, o grupo vai tentar decifrar as razões pelas quais os pilotos não apenas não terem compreendido que o avião estava caindo, mas também parecido ter subestimado os alarmes de emergência, conforme Bouillard.

As investigações vão persistir até o final do ano, e o relatório final do BEA sobre o acidente será publicado ao longo do primeiro semestre de 2012. Por enquanto, o órgão reconhece que foi o congelamento das sondas de velocidade (chamadas pitot) que iniciou o problema no voo, nove minutos depois de o comandante de bordo ter deixado a cabine para descansar.

A partir desse momento, o alarme estol soa por 54 segundos consecutivos - tempo que os pilotos teriam para compreender o que acontecia e retornar à normalidade. De acordo com o chefe das investigações, passado esse período, não era mais possível recuperar o voo.

O comandante de bordo retornou à cabine exatos 49 segundos após o início da perda de sustentação - ou seja, não poderia ter evitado a tragédia. De acordo com Bouillard, os três profissionais da Air France só tiveram consciência de que estavam prestes a afundar no oceano quando restava apenas um minuto para o choque. "Os passageiros provavelmente não perceberam nada. E mesmo se os pilotos compreenderam que estavam próximos demais do mar, não houve mensagens de desespero deles gravadas nas caixas-pretas."

Presente na coletiva de imprensa, Robert Soulas, presidente da Associação Ajuda Mútua e Solidariedade, que representa das famílias das vítimas francesas, lamentou que o BEA tenha enfatizado a possível responsabilidade dos pilotos no acidente em detrimento das consequências da falha das sondas de velocidade. "Não se pode esquecer que foi essa falha que desencadeou tudo. Se não tivesse havido falha mecânica, não teria acontecido acidente nenhum", disse Soulas. "Não vamos deixar esse ponto entrar em segundo plano e exigimos que tanto a fabricante, Airbus, quanto a companhia, Air France, sejam responsabilizadas por esta catástrofe."

O acidente do AF 447

O voo AF 447 da Air France saiu do Rio de Janeiro com 228 pessoas a bordo no dia 31 de maio de 2009, às 19h (horário de Brasília), e deveria chegar ao aeroporto Roissy - Charles de Gaulle de Paris no dia 1º às 11h10 locais (6h10 de Brasília). Às 22h33 (horário de Brasília) o voo fez o último contato via rádio. A Air France informou que o Airbus entrou em uma zona de tempestade às 2h GMT (23h de Brasília) e enviou uma mensagem automática de falha no circuito elétrico às 2h14 GMT (23h14 de Brasília). Depois disso, não houve mais qualquer tipo de contato e o avião desapareceu em meio ao oceano.

Os primeiros fragmentos dos destroços foram encontrados cerca de uma semana depois pelas equipes de busca do País. Naquela ocasião, foram resgatados apenas 50 corpos, sendo 20 deles de brasileiros. As caixas-pretas da aeronave só foram achadas em maio de 2011, em uma nova fase de buscas coordenada pelo Escritório de Investigações e Análises (BEA) da França, que localizou a 3,9 mil m no fundo do mar a maior parte da fuselagem do Airbus e corpos de passageiros em quantidade não informada.

Após o acidente, dados preliminares das investigações indicaram um congelamento das sondas Pitot, responsáveis pela medição da velocidade da aeronave, como principal hipótese para a causa do acidente. No final de maio de 2011, um relatório do BEA confirmou que os pilotos tiveram de lidar com indicações de velocidades incoerentes no painel da aeronave. Especialistas acreditam que a pane pode ter sido mal interpretada pelo sistema do Airbus e pela tripulação. O avião despencou a uma velocidade de 200 km/h, em uma queda que durou três minutos e meio. Em julho de 2009, a fabricante anunciou que recomendou às companhias aéreas que trocassem pelo menos dois dos três sensores - até então feitos pela francesa Thales - por equipamentos fabricados pela americana Goodrich. Na época da troca, a Thales não quis se manifestar.

Fonte: Especial para Terra
Compartilhar
TAGS
Publicidade