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As criancas judias checas salvas pelo 'Schindler britanico'

1 jul 2015 - 18h56
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Em 1º de julho de 1939, em meio à Segunda Guerra Mundial, um trem com 241 ocupantes partia de Praga, capital da República Tcheca, como parte do esforço de um corretor de ações do Reino Unido para salvar crianças judias da perseguição nazista em meio à Segunda Guerra Mundial.

Heroismo de Nicholas Winton só veio à público no fim dos anos 1980
Heroismo de Nicholas Winton só veio à público no fim dos anos 1980
Foto: Reuters

Por conta própria, ele buscou famílias britânicas e suecas dispostas a acolher os pequenos fugitivos em suas casas, conseguindo desta forma evitar que 669 crianças fossem parar em campos de concentração.

Exatos 76 anos depois da partida daquele trem, que levava o maior contigente de crianças, este homem, Nicholas Winton, conhecido também como o "Schindler britânico", faleceu aos 106 anos.

Esta história só foi conhecida 50 anos depois do fim do conflito e, até hoje, mais de 370 destas crianças nunca foram localizadas. Mas aquelas que foram encontradas podem hoje contar como Winton provavelmente salvou suas vidas.

"Certo dia, meu pai chamou a mim e a meu irmão e disse, 'sentem-se meninos, vocês farão uma longa viagem'", diz John Fieldsend, hoje com 84 anos.

Nascido na Alemanha, Fieldsend chamava-se originalmente Hans Heinrich Fiege. Sua família fugiu para a República Tcheca quando a perseguição nazista começou, antes do início da guerra.

"Conforme o trem ia embora, minha mãe tirou seu relógio do pulso, o passou para mim pela janela e disse 'lembrem-se de nós'."

Lia Lesser, de 84 anos, hoje vive em Birmingham, no Reino Unido, e foi originalmente acolhida por uma mulher que vivia na Ilha de Anglesey.

"Não sabíamos se veríamos nossos país de novo", ela diz. "Acho que eles sabiam que havia boas chances de isso acontecer e foram corajosos por nos deixar ir."

'Longa fila'

Os objetivos humanitários de Winton, que nasceu ao norte de Londres em maio de 1909, estavam amparados por uma lei britânica de 1938 que permitia a entrada de crianças refugiadas com menos de 17 anos no Reino Unido, contanto que fosse feito um depósito para custear sua volta para casa.

Ele montou um escritório em um hotel de Praga e passou a receber famílias desesperadas para tirar seus filhos do país antes da invasão nazista.

"Havia uma longa fila que terminava em um pequeno escritório, onde recebíamos formulários para preenchermos", diz Ruth Halova, de 90 anos, uma das sobreviventes.

"Dentro de três meses, recebíamos o nome dos pais adotivos que estavam preparados para nos receber."

Winton trabalhou em conjunto com organizações humanitárias para preparar o transporte das crianças. No total, oito trens saíram de Praga, com outras formas de transporte organizadas a partir de Viena, Áustria.

"Nunca soube como minha mãe conseguiu isso. Ela nunca falava sobre o assunto", diz Zuzana Maresova. "Todos estávamos empolgados porque pensávamos que era uma aventura."

Ela ainda guarda na memória a imagem de todos os pais com seus rostos pressionados contra os vidros dos vagões e com lágrimas. "Perguntava-me por que eles estão chorando."

"A próxima coisa de que me lembro é de ser entregue a um homem que não falava tcheco", diz Maresova sobre sua chegada à Inglaterra. "Ele tinha um papel com perguntas em inglês e tcheco. Sempre que queria me perguntar alguma coisa, ele apontava para o papel."

Lesser diz que, nos início, ela se comunicava por carta com seu país por meio da Cruz Vermelha. Mas depois as cartas pararam de chegar. "Acho que foi quando eles estavam em Auschwitz.

Quando a guerra acabou, ela diz ter se dado conta de que eles "pereceram".

'Adeus'

Fieldsend recebeu uma carta após o fim da guerra, em 1946, e diz que seu primeiro pensamento ao recebê-la foi: "Meus pais estão vivos".

"Minha mãe escreveu: 'quando você receber esta carta, a guerra terá acabado... queremos dizer adeus a você - nosso bem mais precioso no mundo e que só pudemos ter por curto período de tempo."

A carta listava outros membros de sua família que haviam sido levados. Nela, seu pai escreveu: "Vamos rumo ao desconhecido com a esperança de vê-lo de novo quando Deus assim o quiser".

Fieldsend descreve a carta como "fantástica", acrescentando: "Que pais maravilhosos eu tinha".

Halova teve a sorte de voltar a estar com sua mãe após a guerra e descreve isso como a "resposta a minha maior oração".

Os pais de Milena Grenfell-Baines, de 85 anos, também sobreviveram, mas como ela foi parar em um dos trens permaneceu um mistério por muitos anos.

Foi só em 1988, quando a mulher de Winton, Grete, descobriu um caderno de anotações em seu porão contendo muitos documentos, entre eles os nomes das crianças resgatadas, que o ato de heroismo de seu marido veio à tona.

Naquele ano, ele conheceu algumas destas crianças, hoje adultos, no programa "That's Life", da BBC.

"Foi uma grande surpresa, mas não maior do que a do Sr, Winton, que foi ao estúdio sem saber que iria estar diante de nós", diz Grenfell-Baines, que foi convidada para o programa sem saber o motivo.

Halova descreve Winton como um "ser humano excepcional": "Amamos ele desde o primeiro momento - quem não amaria o Nicky?".

"Ele assumiu tantos riscos e organizou seu plano de forma brilhante", diz Fieldsend.

Winton teve seu trabalho comparado ao de Oskar Schindler, que salvou muitos judeus, e foi condecorado como cavaleiro pela Rainha em 2003.

"É incrível que um único homem tenha sido capaz de salvar 669 crianças e que ninguém sabia disso", diz Halova.

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